30 de abril de 2020

Celebraremos 34 anos da criação de nossa amada Diocese de Guanhães




Querido povo da nossa amada Diocese de Guanhães!
Viva, São Miguel! Viva São José Operário!

A nossa Diocese de Guanhães completará, amanhã, 34 anos de evangelização. Pela primeira vez celebraremos o aniversário de nossa Diocese sem a presença física dos nossos diocesanos. Digo presença física, porque todos se fazem presentes espiritualmente, rezando conosco, através dos meios de comunicação – redes sociais.

Com isso retomamos o sentido da Igreja Doméstica, como nos falou o Apóstolo São Paulo na Primeira Carta aos Coríntios (1 Cor 16,19), nas saudações finais: “As Igrejas da Ásia enviam saudações a vocês. Áquila e Priscila, com a Igreja que se reúne na casa deles, enviam a vocês muitas saudações no Senhor.”

O Catecismo da Igreja Católica, quanto à Igreja Doméstica, assim nos fala: “Cristo quis nascer e crescer no seio da Sagrada Família de José e Maria. A Igreja não é outra coisa senão a ‘família de Deus’. Desde suas origens, o núcleo da Igreja era, em geral, constituído por aqueles que ‘com toda a sua casa’ se tornavam cristãos. Quando eles se convertiam, desejavam também que ‘toda a sua casa’ fosse salva.”(Cat. Nº 1655).

Devido à Pandemia da Covid-19 que atormenta a humanidade, a necessidade do isolamento social tornou-se imprescindível para a preservação da vida. As famílias, de seus lares, têm demonstrado e irradiado uma fé viva, transformando, de fato, suas casas em verdadeiras Igrejas Domésticas.

Neste dia em que a Igreja comemora São José Operário, dia do trabalho, quero me dirigir a todos vocês que, de suas casas, rezam conosco pela caminhada da nossa Igreja diocesana, fazendo sempre memória de todos aqueles e aquelas que por aqui já se passaram e deixaram a sua preciosa semente de evangelização.

Destacamos nosso primeiro bispo Dom Antônio Felippe da Cunha (in memoriam), Pe. Saint Clair Ferreira Filho (in memorian), Administrador Diocesano, Dom José Heleno (Administrador Apóstolico), Dom Emanuel Messias de Oliveira, o então Pe. Marcello Romano, Administrador Diocesano, Dom Jeremias Antônio de Jesus, Dom Darci José Nicioli, Administrador Apostólico e tantos outros padres, leigos e leigas que ajudaram a construir a história desta Diocese.

Exorto a todos para não desanimarem. Esta fase difícil, com a graça de Deus, passará logo, e, assim, poderemos nos reencontrar em nossas Celebrações Litúrgicas, encontros de formação, e, num afetuoso abraço, acolhermo-nos como filhos e filhas de Deus, formando uma verdadeira Comunidade Eclesial Missionária, alicerçada no Pilar da Palavra, do Pão, da Caridade e da Ação Missionária.

Concluindo com esta Oração, peçamos a Proteção de São José Operário por todos nós, de modo especial para todos os trabalhadores empregados e desempregados, que com seu trabalho, participam do prolongamento da obra da criação:

Ó Deus, que aprendamos com São José
Operário, homem de bondade, esperança e
humildade, o carpinteiro de Nazaré, que disse sim ao
Senhor, cuidando de Vossa Sagrada Família, o mesmo fazer.

Ó Deus, que aprendamos com ele,
homem do povo, patrono de todos
trabalhadores, compromissos inadiáveis com
a justiça, a esperança, a paz, o amor e a fraternidade.

Ó Deus, por intercessão de São José Operário,
Vos pedimos que nunca nos falte trabalho digno
e salário justo, para que continuemos com força e coragem
a fazer do trabalho um prolongamento da Vossa Obra da Criação.

Que a exemplo de São José Operário,
aprendamos a amar, a vibrar e a sorrir com o labor
de cada dia, para que muitos frutos sejam produzidos.

Por intercessão deste grande Santo
agradecemos, ó Deus Todo-Poderoso, pelos benefícios
que nos tendes concedido, por meio do Vosso Amado Filho
que vive e reina em comunhão com Vosso Espírito. Amém.

PS: Escrito em parceria com o Pe. Dilton - Coordenador Diocesano de Pastoral da Diocese de Guanhães - MG


27 de abril de 2020

Contemplar Cristo na Liturgia



A Constituição Sacrosanctum Concilium (SC), carta magna da Liturgia de rito romano, foi promulgada em 4 de dezembro de 1963 por Paulo VI. Com ela, a Igreja Latina teve a oportunidade de redescobrir a fonte de sua espiritualidade, há muito esquecida: a Sagrada Liturgia. Uma análise profunda da Constituição nos fará perceber que, em síntese, a Liturgia é Cristo. Sua vida, sua pessoa, sua palavra e suas ações podem ser contempladas, saboreadas e vividas mediante os ritos e preces da Igreja. Numa expressão muito simples, mas de grande teor teológico: “Liturgia é a encarnação do Mistério Pascal em nosso corpo.” 1

Essa compreensão sobre a Sagrada Liturgia é fruto de um longo percurso: o Movimento Litúrgico, que começou no final do século XIX. A SC só pode ser compreendida dentro deste grande processo de renovação da vida cristã. A valorização das fontes bíblicas, patrísticas e litúrgicas – documentos antiquíssimos que narram, exprimem e até regulamentam a vida espiritual da Igreja dos primeiros séculos – foi decisivo para a confecção da Constituição sobre a Liturgia.
A Liturgia é Cristo
Sua vida, sua pessoa e sua palavra podem ser contempladas e vividas mediante os ritos da Igreja
Uma consulta mais pormenorizada do texto da SC nos fará perceber várias citações não apenas bíblicas, mas de teólogos da época patrística (Inácio de Antioquia, Agostinho). Há também muitas alusões aos textos litúrgicos (Sacramentário Veronense, Missal Romano). Por esta razão, costuma-se dizer que o Concílio devolveu a Liturgia às suas origens, uma vez que muitos elementos haviam se perdido ou descaracterizado com o passar do tempo.
Evidentemente, as orientações emanadas da Sacrosanctum Concilium não se limitam ao “restauro” de elementos rituais que tinham caído em desuso como o Salmo Responsorial, a homilia e a oração dos fieis no caso da Missa. A SC propôs uma compreensão diferente sobre a Liturgia, daquela que estava em vigor. A Liturgia, toda ela, e não apenas a Celebração Eucarística, é vista como expressão e manifestação do Mistério de Cristo total: cabeça e membros (SC 2).
Rompe-se com aquela compreensão puramente cerimonial dos ritos e parte-se para a aproximação pastoral, teológica e espiritual que entende a linguagem antropológico-cultural e religiosa como decisiva para seu incremento. Sobre isso, o número 5 da SC afirma: “havendo outrora falado muitas vezes e de muitos modos aos pais pelos profetas (Hb 1,11), quando veio a plenitude dos tempos, mandou seu Filho, Verbo feito carne, ungido pelo Espírito Santo, para anunciar a boa nova aos pobres, curar os contritos de coração como médico da carne e do espírito, mediador entre Deus e os homens. Com efeito sua humanidade, na unidade da pessoa do Verbo, foi o instrumento de nossa salvação”.
Pe. Márcio Pimentel
In: Opinião e notícias 9.03.2018

EMAÚS: recordar a história – sentir a história

"Conversavam sobre todas as coisas que tinham acontecido” (Lc 24,14)
Nossa vida é parte da História, e esta, por sua vez, é formada pelas histórias de nossas vidas, pontilhadas e marcadas pela presença de outras muitas histórias.
História, por si mesma, é provocante e nos fascina; ela tem um estranho poder de sedução. Nós nos reconhecemos nas histórias da História; isso nos facilita tomar consciência de onde estamos e quem somos, e nos ajuda a assumir decisões mais maduras frente aos desafios e surpresas que a vida nos reserva.
A vida só tem sentido quando se torna História, isto é, quando não se limita a repetir o passado, mas quando engendra algo novo e diferente a partir de uma História internalizada e saboreada.
É somente no nível mais profundo que o ser humano transforma seu “tempo” em história e seu “espaço” em encontro.
No relato dos “discípulos de Emaús”, o encontro com o Ressuscitado nos ajuda a “ler” a História, pessoal e coletiva, de uma maneira diferente e instigante. A história triste e fracassada dos dois discípulos adquire um novo sentido a partir da luz dos relatos bíblicos que o Peregrino traz à memória.
A partir da “memória bíblica”, eles são movidos a “re-ler” a própria história com novos olhos, re-construindo-a, dando a ela um novo significado e deixando-se impelir a escrever uma nova história.
Marcados pelo dinamismo da Ressurreição, cremos profundamente na força evocativa e transformadora da história; encontrar-nos com ela significa caminharmos para o interior do mistério da mesma história; significa também deixar-nos questionar, iluminar e mobilizar por ela.
Com isso, re-iniciamos um novo caminho de aventura, que consiste não só em receber e celebrar a história, mas atualizá-la, reescrevê-la, confirmá-la... Uma história com rosto de futuro... e um futuro inspirador.
história se revela, assim, como um húmus vivente, uma atmosfera de graça, uma torrente subterrânea na qual se nutre todo o processo do seguimento de Jesus. Não é fora da História e de sua história que o(a) seguidor(a) de Jesus pode reconhecer a Vontade de Deus e escutar Seu apelo; porque “Deus se fez História” e só o Verbo Encarnado, agora Ressuscitado, pode ser “o verdadeiro fundamento da história” (S. Inácio). A partir do Jesus ressuscitado, a história de cada um e da humanidade inteira adquire uma nova luz e um novo sentido e se abre a um vasto horizonte de compromisso.
história pessoal do cristão e a história do mundo tornam-se, portanto, o “lugar” habitual da experiência de Deus, a montanha da misteriosa sarça ardente que não se consome. 
Fazer memória das histórias não significa querer mudá-las, mas adquirir nova perspectiva, um novo olhar. Com freqüência, esta perspectiva nos ajuda a entender melhor nossa situação atual. Trata-se da “memória agradecida”: tudo tem sentido, nada é desperdiçado...
Quando a história é contada e re-contada, acontece a cura da memória. Em lugar de uma história opressiva e pesada, passamos a contar com uma “história redentora”. O momento da Graça é precisamente esse: quando, de repente, a perspectiva muda, encontramos um “novo sentido” e surge uma saída do emara-nhado de lembranças, emoções e histórias de fracassos e decepções.
Isso aparece claramente no relato evangélico deste domingo.
Na narrativa, o Forasteiro ajuda os dois discípulos a “desatar” o nó de suas lembranças traumáticas e a compor uma nova história. A história de Jesus, com seu fim decepcionante, tornou-se pesada e eles procuram fugir de Jerusalém e da terrível lembrança da morte do Mestre. Mas a história os acompanha na estrada. Não param de repeti-la. Mesmo quando dizem as palavras certas, a intensidade emocional da experiência não lhes permite ouvir a história de uma perspectiva diferente. 
Enquanto caminhavam, conversavam e discutiam com tal intensidade que nem perceberam a aproximação do forasteiro. Falar de maneira tão intensa de uma experiência recente demonstra que ela teve forte impacto na vida deles, mas o significado desta dura experiência está envolvido numa obscuridade.
Para eles, a história não faz sentido. A história de Jesus, com seu fim decepcionante, tornou-se agora traumática. Esforçam-se para encontrar a única coisa que vai ajudá-los a superar a dor, transformar a lembrança, permitir que continuem suas vidas, refugiando-se no passado.
Foi preciso discernimento por parte do Forasteiro para libertar seus discípulos daquela interpretação nociva da história. Ele reorienta a história sem diminuir a gravidade do que acontecera.
O Forasteiro não só reconta a história de Jesus, mas também tem de remodelar todas as histórias das relações de Deus com Israel. A “história pessoal” é “recontada” e considerada no contexto de uma história muito mais ampla; há uma ligação profunda entre todas as histórias, constituindo-se na grande História da Salvação. A descoberta desta nova perspectiva acontece como momento de graça que desce sobre eles.
história re-contada começa a reconstruir a humanidade deles, a esperança vai retornando, os corações vão se aquecendo, a alegria vai surgindo em seus rostos... O Forasteiro, ao criar um círculo de confiança, abriu “espaço terapêutico” para que os discípulos contassem sua história em segurança e começassem a re-alimentar uma nova esperança. Foi criado um ambiente de hospitalidade que culminou na Ceia.
É nesse ambiente que a taça do sofrimento transformou-se na “taça da esperança”.
Das cinzas brotaram a esperança, o entusiasmo e os sonhos... e eles apressaram-se a voltar para Jerusalém a fim de partilhar a descoberta de um novo sentido da história. 
A partir do fundamento da História (Jesus Cristo), contemplamos nossa própria história (pessoal e institucional): história que deve ser observada, lida, discernida. Tal experiência nos ajuda a abrir os olhos para a novidade inesgotável da vida, nos faz “aquecer o coração”, desperta em nós o desejo e mobiliza todas as nossas capacidades para um compromisso de ação transformadora na história pessoal e coletiva.
História está sempre aberta, desafiando-nos, arrancando-nos de nosso imobilismo, despertando nossa criatividade para ser re-escrita de uma maneira diferente.
Nossa história pode ser poderosa motivadora de mudança; ela nos levanta quando estamos dispersos e sem direção; ela não é apenas relato do passado, mas parte viva do que somos agora; ela nos traz para “casa”, para nossa própria integridade e identidade.
Assim, a experiência pascal significa “conhecer”, “sentir” e “amar” a nossa própria história. É uma verdadeira experiência de Ressurreição.
Só assim a história se converte em “Epifania” (manifestação) de Deus e nos permite compreender, acolher e integrar tudo o que acontece, dentro e fora de nós.
Este é um tempo de Graça: o encontro vivo da “história” celebrada com o compromisso de construção da “nova história”, mais ousada e mais criativa. Trata-se de um momento tão fortalecedor e jubiloso que estremecemos reverentes diante do que celebramos.
Sem a luz da Ressurreição, nossa história, pessoal e coletiva, se reduz a eventos opacos, vazios, tristes...
Com a Ressurreição, a história se ilumina, se transfigura e nos desafia. A Ressurreição plenifica, dá sentido e costura os eventos, constituindo-se em “História de Salvação”. Ela nos faz ver o que todo mundo vê, mas de um “modo” diferente: vemos mais longe, vemos além, vemos mais fundo... 

Texto bíblico:  Lc 24,13-35

Na oração:   Diante da história pessoal e social, sinto-me desafiado? Paralisado(a)? com medo? Inquieto(a)?
                    Quanto de esperança carrego em meu interior?
                    O que me faz abrasar o coração diante de uma história que parece um fracasso?



Pe. Adroaldo Palaoro sj