10 de fevereiro de 2020

Celebrar a Catequese: melhor caminho de iniciação litúrgica

“Fazendo é que se aprende”, vive dizendo o nosso povo! Essa sabedoria retrata bem a dimensão prática da nossa vida e aplica-se à catequese frente à sua missão de iniciar o catequizando à vida litúrgico-sacramental. Podemos até ir mais além, afirmando que este “aprender” não se refere apenas ao aspecto dos conhecimentos, mas, sobretudo na liturgia, visa ao encantamento, ao despertar da sensibilidade para o contemplativo, o simbólico e o orante, dimensões fundamentais para que a vivência litúrgica se dê com proveito e satisfação. Aqui cabe outro ditado: “ninguém ama o que não conhece”!
Uma situação ocorrida há muitos anos não me sai da cabeça: uma catequista, aflita, me procurou, se sentindo fracassada em sua missão. Tudo isso porque sua catequizanda, de sete anos de idade, havia lhe perguntado: “catequista, por que tem um micro-ondas lá na capela”? Tratava-se de um sacrário de aço, de forma retangular, ao qual a menina vinha observando há dias, até que não conteve a pergunta. Procurei mostrar à catequista o quanto a criança havia sido inteligente em sua comparação, bem como a necessidade de uma catequese mais iniciática ao mundo simbólico que compõe a liturgia, mundo esse tão distante do cotidiano de nossas crianças (e também dos adultos!).
Não se trata, portanto, de uma catequese expositiva, que fale sobre liturgia, suas orações e riquezas simbólicas, mas de uma catequese que leve a experiências, verdadeiras vivências dessa riqueza simplesmente desconhecida – e por isso mesmo ignorada! – da nossa liturgia. O documento 11 da CNBB é preciso ao afirmar: “Os catequistas devem se empenhar nessa tarefa, a fim de que as crianças, conscientes de um certo sentido de Deus e das coisas divinas, experimentem, segundo a idade e o progresso pessoal, os valores inseridos na celebração eucarística, tais como: ação comunitária, acolhimento, capacidade de ouvir, bem como a de pedir perdão, ação de graças, percepção das ações simbólicas, da convivência fraterna e da celebração festiva.”
Por isso falamos de celebrar a catequese, e não na catequese. Celebrar o processo catequético e não apenas de vez em quando, por conta de ocasiões especiais e tão raras. É fundamental que o catequista esteja atento ao que acontece no dia a dia da sua comunidade, na vida das crianças, no calendário litúrgico da Igreja e nos temas propostos no itinerário catequético. Tudo é motivo de celebração e se presta à iniciação dos catequizandos ao mistério litúrgico, que se vale dos sinais e palavras para se revelar e tocar nosso coração, fortalecendo a nossa fé e vida cristã.
É no decorrer dos encontros catequéticos que uma vela, por exemplo, passa a ser respeitada como sinal litúrgico, “veículo” da mensagem de fé no Ressuscitado ou da graça batismal, e não apenas um pedaço de cera. É no processo catequético que um sacrário, não importando seu modelo, deixa de ser uma obra de arte ou um micro-ondas e passa a ser lugar especial da presença do Cristo Eucarístico, também alimento para nossa vida, comida a ser servida na grande refeição dos discípulos de Jesus, cujo alimento é seu próprio Corpo para a vida do mundo. 
Pe. Vanildo Paiva 

Entre o caos e o êxtase

É possível pensar e viver o eterno caos?
É possível e desejável o eterno êxtase?
Nem um nem outro!

A vida oscila entre o caos e o êxtase, em sua exata medida, de modo que o excesso de alguma coisa pode ser tão ruim quanto a sua falta.

Não suportaríamos um caos absoluto, bem como não haveria possibilidade do eterno êxtase, logo, viver é buscar este equilíbrio necessário em nossa vida.

Há muitas coisas que acontecem que chamamos de caos, que parecem ser intransponíveis.

Quantas vezes ouvimos ou mesmo dizemos: “Minha vida está um caos!”
Mas aqui está a grandeza da vida: uma situação caótica clama sempre por superação, ainda que parcial, sem a pretensão de se chegar ao êxtase... 

Caos relacionamento conjugal pede o diálogo, a luz divina, a reconciliação, o perdão, a superação... 
Busca da felicidade possível: entre o caos e o êxtase.

Relacionamento caótico prolongado e/ou êxtase contínuo num casamento é impensável e, muitas vezes, insuportável.

Caos numa relação de amizade pede maior proximidade, maior sinceridade, dedicação, expressão de carinho, avaliação, ponderação, maior atenção com aquele a quem chamamos de amigo.
Reforçar o laço de amizade: entre o caos e o êxtase.

Caos na vivência comunitária pede a proximidade, liberdade, intimidade, solidariedade, amor e verdade.
Fortalecimento da verdadeira comunhão querida: entre o caos e o êxtase.

Caos pela partida abrupta e violenta de uma pessoa pela morte, com suas cicatrizes, que somente com o tempo se tornam suportáveis e superáveis.

A morte muitas vezes se apresenta como caos para quem fica. A sensação de nunca mais a felicidade, de nunca mais o sorriso, a alegria… Mas o mistério da vida comporta a superação da morte. Somente o êxtase vivido em alguns momentos daquele relacionamento é que se tornará fonte para a continuidade do existir.
Viver entre o caos da morte e o êxtase que a vida pode proporcionar.

Caos na vida profissional pede revisão, aperfeiçoamento, novas janelas, novas portas, novas experiências, novos contatos, a busca daquilo que possa, de fato, a pessoa como profissional, realizar: qualificação e realização profissional, na exata medida, entre o caos e o êxtase.

Caos econômico mundial pede a tomada de consciência de que recursos são escassos, economia tem seus limites, há limites para o capital e seu nefasto estrangulamento da vida de pobres e inocentes. 
Uma economia globalizada e solidária: entre o caos e o êxtase.

Caos político que multiplica atentados, bombas, vidas destruídas, restos de construções, dores e profundas desolações. Lágrimas de crianças inocentes em capas de jornais estremecem nosso coração.
E, nos perguntamos: "até quando o caos?"

Não creio que o êxtase do relacionamento entre os povos e nações seja possível, pois muitos são os interesses em jogo, radicalismos exacerbados…
Mas no mundo um clamor: convivência na harmonia possível entre o caos e êxtase.

Caos planetário  agrotóxicos, queimadas, ocupações não planejadas, monoculturas de solos destruidoras, camada de ozônio, aquecimento global… superexploração dos recursos finitos pedem – nova mentalidade, nova postura, novos modos de se relacionar com a criação.

Uma nova mentalidade ecológica há que se fortalecer entre o caos e o êxtase da primeira criação.

E a vida tem seus mistérios, seus encantos e desencantos, encontros e desencontros, buscas e perdas, altos e baixos, luzes e sombras, sonhos e pesadelos, ausências e presenças, ausência de sentido e sua eterna busca, coerências e contradições, enfrentamentos e superações, louvores e lamentações…

A vida é, por isto, um livro a ser escrito, página por página, em que o fio condutor é a busca da felicidade, entre o caos e o êxtase, o percorrer de caminhos, às vezes tenebrosos e algumas vezes, ainda que poucas, veredas ensolaradas.

Com a inesgotável luz divina acolhida quotidianamente, vamos procurando o equilíbrio entre o caos e o êxtase.

Sejamos cumulados com a luz divina para que nossos sonhos se tornem perceptíveis no caos, pois sem ela, nossos sonhos teriam contornos e conteúdos de pesadelos.

Sejamos cumulados, também,  de gratidão divina, para que o êxtase, ou o seu próximo alcance, não nos faça vítimas da arrogância, onipotência, e indiferença do que merece toda a honra, glória e louvor.

Nem caos que nos desmorone e nos roube perspectivas, pedimos ao Senhor, nem êxtase que nos faça indiferentes à Sua imprescindível ação e presença. Amém.

Dom Otacilio Ferreira de Lacerda
Bispo Diocesano de Guanhães